Para a presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Cármen Lúcia, a revisão do foro privilegiado para parlamentares favorece a Operação Lava-Jato. Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, ela defendeu as três outras medidas consideradas fundamentais pela força-tarefa para o êxito da operação: delação premiada, prisões preventivas e execução de pena após condenação em segunda instância. Nenhuma delas é unanimidade no STF.
1 – A votação sobre o foro privilegiado foi, de certa forma, um reencontro do Supremo com a opinião pública?
Pode ter sido um reencontro, mas por coincidência, porque ele não foi pautado por isso. Já vinha desde maio, teve um pedido de vista, foi liberado agora no final de setembro e imediatamente coloquei na pauta porque é importante.
2 – O decano Celso de Mello antecipou voto para ratificar a maioria expressiva. Foi um recado para a sociedade?
Quanto mais os ministros estiverem afinados num tema, mais a jurisprudência tende a permanecer e fortalecer o STF. Isso passa segurança. Com 6 a 5, uma mudança de ministro pode gerar nova jurisprudência.
3 – A revisão do foro vai resolver todos os males da Justiça brasileira?
Não, um juiz de primeiro grau não resolve tudo, mas muda a forma e pode ser mais rápido na prestação da jurisdição. Numa República, todo mundo tem de ser julgado pelo juiz natural. Você não pode, já no artigo primeiro da Constituição, ter estabelecido a República, que tem na igualdade o seu fundamento, e depois desigualar
4 – A revisão do foro não pode gerar uma enxurrada de questionamentos?
Todos os casos que vêm a juízo têm alguma dúvida e toda nova lei gera perplexidade na interpretação, na forma de aplicação. Se vierem dúvidas, e não acho que serão tantas assim, serão resolvidas e, dentro de pouco tempo, isso vai chegar a um consenso.
5 – Para políticos, é melhor um julgamento por 11 ministros, ao vivo, ou por um juiz que ele conhece, sem holofotes?
O importante é a garantia da igualdade, para o político e para quem não é político. Não se deve presumir que o juiz fica vulnerável à pressão ou à presença ali e o Ministério Público tem que ficar alerta, questionar, recorrer.
6 – A revisão do foro privilegiado favorece ou prejudica a Lava-Jato?
Favorece, porque faz com que aquilo que é relativo à Lava-Jato seja julgado de maneira mais rápida e separa o que diz respeito a mandato, o que não diz, o que é anterior, o que não é. Portanto nós teremos maior celeridade. Os processos da Lava-Jato precisam ser julgados. A sociedade espera uma resposta, quer para condenar, quer para dizer que determinadas pessoas sejam absolvidas. É preciso que se julguem os crimes de corrupção, que ninguém suporta mais.
7 – Diante da exaustão com a corrupção, os fins justificam os meios?
A corrupção precisa ser combatida e a lei, cumprida. Em nome do combate à corrupção não se pode atropelar a Constituição nem a lei.
8 – O julgamento sobre a execução de pena após condenação em segundo grau está entre suas prioridades?
Sou a favor da execução após decisão de segunda instância e tudo o que é importante para o País é prioritário, mas já há decisões consolidadas sobre isso e colocar de novo em pauta pode não ter urgência. Talvez por isso o ministro [Marco Aurélio Mello] não tenha ainda liberado.
9 – Sem a prisão em segunda instância, continua a protelação eterna?
Esse é um problema. Não dá para manter um sistema feito para que se possa protelar para sempre a finalização e o Judiciário não dar uma resposta a isso. Diante de evidências de que a pessoa se vale do direito para litigar indefinidamente, o Poder Judiciário deve usar os instrumentos de que dispõe para dar uma resposta.
10 – E as prisões preventivas?
Prisão preventiva é sempre fundamentada, não vejo abuso nenhum.
11 – A delação premiada é tida como fundamental para a Lava-Jato, mas há quem, até no STF, defenda a revisão.
A colaboração premiada é um instituto que veio pra ficar e é da maior significação. Não se consegue investigar e apurar dados de uma organização sem alguém lá de dentro.
12 – O excesso de benesses da delação da JBS foi um ponto fora da curva?
Talvez tenha sido, mas lei nova precisa ser interpretada e não combatida. E o próprio ex-procurador geral [Rodrigo Janot] pediu a revisão.
13 – Mas depois de um estrago enorme que atingiu o presidente da República…
É uma lição. Eu não sou do MP, mas, diante de fatos graves que agridem a sociedade inteira, imagino que a tendência seja buscar a apuração a qualquer custo. Nesse caso, o custo foi alto mesmo. Mas é preciso que todos sejam investigados diante de determinados relatos.
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